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Mostrando postagens de 2015

Mendigar-te

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Lembra-te de quando mergulhastes em mim? Em meus seios, em minha boca... prazer sem fim.... Mas teve um fim. Brusco. Dilacerado. Obcecado. Doído. Do fundo de meu peito apertado escorrem, até hoje, lágrimas de caco de vidro de porcelana de tudo o que é cortante no mundo. Seu toque suave deixou de ser macio e se tornou áspero, bárbaro, e eu diria, até, ríspido. Não sei ao certo dizer de quem foi a culpa: das minhas inconstâncias; dos teus exageros. Mas sei que, nessa mendicância de carinho nós dois acabamos sozinhos.

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Ponho Billy Joel para tocar no rádio. Um arrepio percorre todo o meu corpo. Tenho consciência da minha pequenez em frente ao Universo, ao planeta e, até mesmo, a minha vizinhança em si. Sabe a única coisa que me fazia sentir maior? Maior não, mas ao menos importante... era você, o teu toque, tua voz como doce melodia assobiada levemente aos meus tímpanos e interpretada como adrenalina pelo meu cérebro. Aquela doçura misturada com selvageria; quase um clímax mental, só de te ouvir falar. Mas eu perdi isso, assim como perdi várias outras coisas. Perdi a mim mesma, inclusive. Não sei mais ser aquela quem eu era antes - e nem sei se quero! O que eu quero, mesmo, é me afogar numa imensidão escura, claustrofóbica e calma. Estranho ver palavras tão opostas juntas, não? Nem tanto. O escape não é igual para todos. As vezes a angústia pode ser minha única saída do tédio colossal atual. Recorrentemente tenho me sentido como os poetas da segunda fase do Romantismo brasileiro: sem vivacidade, ap

Evangelho segundo o Século XXI

Um preto morreu no morro, foi vítima de bala perdida. "Ah, mas tava sozinho na rua a noite, foi morte merecida." Uma prostituta é estuprada, morta e largada ao esquecimento. "Também, queria vida fácil, devia ter se dado o respeito." Um umbandista foi apedrejado até a morte e deixado na sarjeta. "Se ele seguisse à Deus seria salvo, mas ele escolheu o capeta..." Um gay é espancado até a morte numa noite fria. "Ninguém mandou se exibir na rua, tem que apanhar mesmo, essas bichas amam putaria!" Uma travesti foi cruelmente assassinada. "Se fosse macho de verdade, não precisaria ser surrado!" Milhares de desculpas para crimes hediondos nos rondam dia a dia - mas que mundo odioso! A intolerância reina nesse reino de homens brancos; de homens brancos héteros; de homens brancos héteros e ricos. E ai dos que lutam! Ai dos que suportam! Ai dos que morrem! Bem aventurados os que matam; que torturam; que ferem. Pois esse

I wish I'd been a Teen Idle...

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Eu não beijo. Eu não danço. Eu não corro. Eu só descanso. E me canso de só descansar.  Eu não rio. Eu não bebo. Eu não lembro e nem faço lembrar.  Eu não marco. Eu não curto. Eu não vivo e não consigo viver.  Eu só durmo, e durmo, e durmo. É foda sobreviver. Quem me dera não desperdiçar minha juventude. Quem de dera dar a cara a tapa alguma vez na vida. Quem me dera ter memórias pra contar. Quem me dera cometer um daqueles grandes erros. Quem me dera ser verdadeiramente livre, e não ter uma falsa ilusão de liberdade. Mas não, isso não é pra mim. Isso não pode ser pra mim. Eu fui criada para ser aquela garota exemplar que só estuda, e não vive. E eu realmente não vivo, só sobrevivo. E eu não aguento. E eu explodo. E eu desmorono semana a semana. E eu não vivo, não experimento, não corro riscos, não faço valer. Dizem por aí que a vida é curta demais para não se arriscar. Dizem ainda que a vida sem aventuras é uma gigantesca perda de tempo. Então me pergunto: o que é que eu estou faze

Manifesto XX

Eu nasci mulher numa sociedade patriarcal Num país onde todo homem mais parece neandertal Desde pequena me ensinaram a ser esposa e submissa “Não use roupa curta e vá sempre à missa!” Me impuseram valores que não eram meus E me fizeram crer que eram vontade de deus “Por favor se respeite, seja uma garota decente” Mil cruzes sobre mim para essa sociedade decadente. Controlavam meus sentimentos e meus relacionamentos Me colocaram medo e ignoraram meus lamentos Eu estava predisposta a ser culpabilizada E não passava pela minha cabeça que a sociedade estava errada. Me privei de muitas coisas para obter tal respeito Mas ninguém nunca se preocupou em esconder seu preconceito. Tudo clareou quando conheci o feminismo Conheci o movimento que me salvou do abismo Do abismo do machismo que eu estava prestes a pular E jogar minha independência toda pelo ar. Descobri a liberdade que é minha por direito Descobri que, na verdade, ninguém pode me por defeito. Eu

Ser Oco

Dizem que eu escrevo por sentimentos.  Na verdade, escrevo por falta do que sentir.  Simulando humanidades, fica cada vez mais fácil lidar com minha desumanidade.  Com minha frieza estúpida que adquiri após anos de tentativas inúmeras - e tolas! - de negar meus sentimentos.  Acabou que, por fim, eles é que me negaram.  Abandonaram, para ser bem explícita.  E eu achava que sofria com eles...  Ah, eu não sabia que eram aqueles sentimentos incontroláveis que me tornavam sã.  Era aquela euforia química e hormonal que me fazia estável.  Agora, não reajo a nada nem a ninguém.  Sem eles me sinto oca, inútil.  Não tenho mais um pingo de empatia, não deliro mais nos balbúcios das paixões, não choro rios de lágrimas (seja por dor ou alívio).  Digamos que a vida sem sentimentos tenha se mostrado algo tão banal que perdeu a própria essência de ser vida.  Meu coração bate em meu peito num ritmo tão mecânico e cronometrado que perdeu todo seu encanto.  Sou só mais uma máqu

Eu, paixão.

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Danço a dança pura que é estar em teus braços. Nada é mais calmante para mim que a tua euforia. Teu toque sobre minha pele me queima, mas instantaneamente me alivia. Nada me faz tão bem quanto teus beijos que, lentamente, vão trazendo á tona o instintivo desejo guardado em meu âmago. Carícias plenas e obscenas, como disse meu bom e velho Chico. Sim, eu adoraria ser a bailarina que repousa em teus braços. Adoraria balançar-me em teu corpo na melodia que apenas a Natureza, exclusivamente, sabe reproduzir. Desde as conversas simples e os planos de futuro até o frenesi orgásmico de um fim de tarde sob as cobertas, aquelas cobertas quentes e aconchegantes (quase o mesmo tanto que o teu abraço). Viajar em tua voz, que chega aos meus ouvidos como doce melodia e se codifica em meus neurônios como puro êxtase. É inacreditável o efeito anestesiante que uma simples pessoa pode causar sobre mim. Isso que ainda nem nos tocamos, não nos beijamos. Provavelmente vou perder a cabeça, mas será

Desses poemas da vida real

Olá, vou me apresentar Se eu não fizesse isso, provavelmente não iriam me notar Enfim, meu nome é Maria, mulher de João E a minha história vocês ouvirão Nasci mulher, pobre, na favela Minha mãe era do lar, mas não do dela Limpava pros ricos, cozinhava pros ricos E pra sustentar eu e meus 5 irmãos, ainda fazia uns bicos Quando eu tinha 2 anos, meu pai saiu de casa E jogou na minha mãe toda essa responsabilidade, que desgraça! Não me lembro dele, mas sei que bebia, e batia E minha mãe, batalhadora, sempre resistia Depois que ele foi embora, ela deu graças a Deus Mas sabia muito bem que tinha que duplicar o esforço pra cuidar dos filhos seus Depois de alguns anos, eu conheci João Homem honesto, carinhoso, e veio a paixão Casamos, tivemos duas crianças, estava tudo indo bem Na nossa casinha no morro com tv, um quartinho e um armazém Até que João apanhou no serviço, por ser preto, por ser pobre Disseram que tinha roubado, que isso não era nada nobre Pobre João, depois de

Monólogo de Maria

Aqui, de frente ao caixão choro por meu amor perdido. João: meu marido, pai das minhas crianças, trabalhador, meu sustento, minha base. Sabe, João nunca quis muita coisa na vida. Uma casinha, aqui no morro mesmo, com as crianças e uma cerveja no fim de semana. Gente como a gente não pode pedir muito mais do que isso não. Essa história de que quem manda só manda porque se esforçou, ah, isso é mentira, balela. Mais do que o meu João se esforçou? Aguentando desaforo e preconceito num trabalho quase que escravo? Isso sim que é esforço, não o que playboy faz, sendo sustentado pelos pais a vida inteira. Mas são eles que levam os créditos. Eu, Maria, mulher da favela, provavelmente não vou ter um futuro muito diferente da minha mãe que, quando papai morreu de tanto beber, teve que arrumar um segundo emprego pra sustentar a mim e meus cinco irmãos. E mamãe, mulher forte, ainda tinha que aguentar xingamento do povo abastado, dizendo que ela só fazia filho pra ganhar ajuda do governo. Agora, meu